4192. Belém – Brasília

Belém - Brasília
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Placa_na_BR-153_Rodovia_Bel%C3%A9m-Bras%C3%ADlia.jpg

Das árvores da história sou um pequizeiro,
semeadura dura para fazer mourões
Nasço do silva-cerrado do Hospital Realístico Fantástico de Ceilondres

Estou com minha mãe na barriga dela,
3,9 kilos,
quando um brejo encho
e formo um rio-araguaia, penso que os buritis seriam guarirobas e tomo um vinho magnífico
Só que não sinto os vultos do estômago

Os boitatás e as mula sem cabeça estão chegando,
os sapos estão indo embora
e os margaridões, os tatuzinhos-de-jardim, os pardais também
As borboletas alaranjadas e pretas
estão fazendo amor livre

[“Toca, Tocantins
Tuas águas para o mar”]

ㅤ ㅤㅤ

ㅤㅤㅤㅤQuem eu vejo não mexe comigo:
ㅤㅤㅤㅤtão em novembro, quase dezembro, réveillon

ㅤㅤ ㅤㅤ

                           ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤ passo…

ㅤㅤ ㅤㅤ

*Canção de Nilson Chaves – “Toca, Tocantins” ‧ 1991

4189. Tinder 1

A boca cheia de botox
Lábios selados com uma cruz
Os peitos são produzidos pelo tombamento
de união estável com plástico
As sobrancelhas estão impecáveis:
espessos, rudes, abundantes
Como o cabelo da dama ruiva
– um alvoroço profundamente completo
Bioplastia nas maçãs do rosto
O nariz é de tom avermelhado e
tem umas bochechas de largura de caminhão

Gosto dela

Formas do nada / Paulo Henriques Britto

Limiar

Uma geografia de dúvidas
Ihe percorria todo o firmamento:
serão serafins? será música
isso que martela incessantemente
e não consegue arrebentar?
As perguntas se dissipam no ar.

E um cardume de corolários
atravessava-lhe o desfiladeiro:
então isto é aquilo, e o contrário
só é verdade do princípio ao meio
etc. Isso proporcionava-lhe
prazer não pouco, e uma penca de álibis.

Definitivamente, sou,
ele pensou, com a magnificência
de um pterossauro em pleno voo.
O saber é sua própria recompensa,
como a virtude, concluiu.
E viu que isso era bom. Depois dormiu.

4188. Arraia

A estrela caiu na minha mão
onde estava procurando um eneagrama dos sonhos.

Uma arraia nadadora saiu de mim
com uma sereia crescente dias depois.

Uma maré estava sondando as algas
derradeiro o lugar onde está o azeviche
o negrume da fossa abissal.

Estava mais calmo
as montanhas mais altas,
macio.

Bem ali no mar, me chegará
no meu apogeu –
como do alumiar –
segurar,
sutil, tênue, delgado,
na depressão do mar a liberdade
dos desejos e medos imensos.

4186.

Procurei a precariedade
dos seus defeitos
em todas suas funções
em casos práticos
em termos gerais
de coisas pra voltar atrás

essas são todas respostas verdes,
néctar maduro homogêneo,
contorcem as correntes mais arcaicas
as folhas que foram tiradas por seus calendários.

4183.

Vou te contar um enigma:
pela janela à noite – lá fora alta –
um aluvião

cascalho, areia, lamaçal.

Uma quentura lateja,
leito dum rio que passa.
Rochedo, planícies,
vigor incessante.

Cresço, eclipso e mínguo.

Vou te clarear pelas manhãs.