cantos sagravam todo o plantio
e sacralizavam toda colheita
naquele pedaço de terra
cercado de vida por todos os lados
nas noites eclipsais
abismávamos nos abismos celestiais
vestidas de lua vermelha e breu
e tínhamos aquele tom
mais próximo do crepúsculo
plantávamos na terra doente
buscando sua cura, corpura,
regando com a água
colhida diretamente dos cachos
de frutas gasosas, sumo e néctar
incolor
cada casa morava uma deusa
um deus, dois adeus, ateus
em cada casa de barro
moldávamos cabeças
preenchíamos cabaças
e com um batuque cadenciado
fazia-se a luz, mais um anjo
amontoava-se o espaço
entre céu e terra
renunciávamos o pecado
e vivíamos de nossas naturezas
ofídicos
as conversas junto ao pé de pau
ali perto das cabras pastando
iam de lá pra cá, submersas
nos cem mil tons do ocaso
éramos poucas, o tanto
suficientes em si
e à porção ocupada
muitos para a festa
nos amávamos como amantes
aos primeiros dias e todos os dias
entre o trato e o trabalho
e o pulsar das rotações
abríamos nosso corpos
nos descorporificávamos
antes do sono restaurador
onde líamos cartas,
borras, bolas, astros, mãos
e o que se via
viria