Nasci numa manhã cinza de julho, com o frio balançando os meus longos cabelos lisos da cor de mel puro de flor da mata virgem. Nasci frio e rosa, com tranças que mediam seis metros cada uma das cinco e da cor de mel puro. Nasci com a cabeça em fogo brando numa manhã pouco rosa e cinza com o frio a balançar minhas cinco tranças de seis metros cada. Minha cabeça reduzia a três.
Nasci expelido do umbigo do meu pai. Minha mãe que me pusera lá. Capivara-cavala-marinha-do-rio. Pai-potro-das-praias. Nasci com dois metros a mais que minhas tranças e com espadas. Meu corpo se reduzia ao infinito em pé.
Meu pai perguntou-me enquanto eu dormia se queria mamar. Sonhei um vasto mar de leite de coco e um homem baixinho e carrancudo de terno, camisa e gravata pretos me pedia dinheiro para mamar nas pedras que saíam da areia e jorravam leite de coco. Cortei a cabeça dele com uma espada que tinha no bolso e o joguei no mar de leite de coco e o leite de coco ficou verde-brejo-vereda e eu vi sua cabeça falar dinheiro, dinheiro.
Acordei com fome dentro de outro sonho e minha mãe costurava minhas tranças que eram cinco e mediam seis metros cada com uma linha grossa e branca. E meu cabelo da cor de mel puro ficou branco. E minha pele que cobria o infinito em pé do meu corpo ficou branca e tudo ficou branco. E minha mãe que costurava os fios brancos no meu branco todo era azul-vidro-leitoso e transparente, espelhada. Minha mãe-peixa-gente.
Quando acordei nesse sonho já não era mais sonho, era só continuação dos dois no céu azul bem limpo que já não era mais de julho, mas de um tempo que viria ainda, como num sonho. Minha cabeça pesava quatrocentos e setenta e um milhos brancos. Minha cabeça reduzia a três. Era uma cabeça com três tranças brancas e meu corpo era branco e minhas costas cortavam pontos vermelhos como fogo em brasa de fogueiras de junho e o tempo que viria era esse, o próximo junho antes do frio que viria.
Minha mãe era minha avó e eram uma peixa-voadora que dava melado de beterraba com mel e eu comia bem devagar para não sujar meu corpo branco e no topo da minha moleira branca, círculos brancos de giz branco foram pintados por meu pai-potro-alado-do-firmamento que morava dentro de um caracol. E minha cabeça-moleira já não tinha mais tranças, era lisa e branca e circular como a lua cheia no meio da noite de junho que viria quando o sol se bastasse mais uma vez no mesmo ponto à mesma altura a iluminar minha cabeça e a lua no que viria a ser. Aquele momento em que estava.
E eu nasci de novo ali. Debaixo de um pé de boldo, os pés limpos de azul-verde do rio que cai no mar cheio de peixas e peixes que viram gente quando pulam pra fora dele pra ver o que tem no além do líquido do mundo, as costas em brasa com pingos cinco em cinco de um vermelho bem ajustados no meio da massa branca de tabatinga que meu corpo moldava.
Nasci de novo numa tarde cinza de julho com o vento frio balançando minha careca e a linha do céu pegando fogo enquanto a noite, lençol negro, cobria a terra com um alento gelado e calmo. Em paz.
Nascência horror maravilha baby boom adentro, fueeeda nenê – paga-me pelo leite de pedra oquê!
Bebês mágicos tem de tocar o horror no mundo. Há de vir a próxima estrela de Belém avisando, e ela será um vórtex et língua de fogo, com um bebê mais que cabuloso.