4142. Do famoso fascismo-barba-de-lenhador

1) Biopolítica

Andávamos como se fôssemos quem éramos
apenas corpos caminhando rumo ao futuro
alinhados em fileiras
de coturnos lustrados e de linhas de montagem
e fechávamos as pernas educadamente
e dizíamos, por favor, agradecida, muito obrigado

sorríamos ao carrasco com um flerte masoquista
e no escuro da noite funda
nos afundávamos em uma liberdade esfumaçada
movíamos o corpo loucamente escutando The Smiths

2) Necropolítica

Começamos a nos despir das necessidades
e nos tornamos quem deveríamos ser
descortinamos os palcos e utilizamos toda a nossa potência
passo a passo e par-e-passo para além do capital
seríamos algo vivo que pode

mas com uma bala decidiam sobre nós
e com uma caneta derrubavam goiabas do pé
podres
e escolheram o dia e a hora da nossa quase vida

Morrissey falou que o nazismo era de esquerda

2) Tecnopolítica

Trocamos nossos desejos por dedos
dedos de joia, dedos deslizantes
uma sociedade de dedos, Eliana era uma visionária

abrimos nossas almas como entrada para os corpos
não precisavam nos amarrar, já tinham enfiado a botina na nossa cara
e nós ainda achávamos que era o justo, o necessário
daí para nos entregarmos foi escorregador e tobogã

o filósofo falou que eu deveria usar azul

4) Psicopolítica

Hoje o nosso fracasso é um sucesso de público e crítica
e escorregamos nossas falhas numa lição de moral
como se fosse interna
e jorramos lições e lições
e a cada hora nossos dedos deslizam em busca de uma dose
e do crente ao ateu todos nos monitoramos
nos amamos aos ódios plenos

o pan-óptico mais amado do mundo

não precisa de jaula
não precisa de grade
por entre as micro janelas dos gadgets tudo é insosso

o capitão pulou da janela de guarda-chuva como um paraquedas

todo mundo foi atrás

e ele tinha uma barba impecável com um relaxante top
e coturnos muito bem lustrados com a própria língua

Deixe uma resposta