Quando a natureza possibilitou as condições ambientais e biológicas necessárias para que a pressão evolutiva permitisse o surgimento de espécies homínidas com uma massa encefálica tal, uma postura tal, uma habilidade tal necessárias à existência de um sistema simbólico e lingüístico que se perpetuasse de geração em geração sem a necessidade da intervenção da manutenção da espécie por meio da perpetuação de certos genes, ela – a natureza – conseguiu perceber-se. Foi esse o sentido da natureza criar o ser humano: contemplar-se. Um projeto narciso e suicida. A contemplação narcisa não está completa sem o mergulho infinito em busca de si. A partir da contemplação da sua própria imagem busca-se a integridade, sua manutenção plena, que só pode ser conseguida através do suicídio. O ser humano fica assim, pois, o espelho e a arma.
O sentido do ser humano baseia-se, assim, em sentir antes de tudo e findar após. Sentir a si e (quase que) a sua criadora: a natureza (ou quase que ele mesmo). A cultura é um mero produto para a natureza se perceber para além de si mesma e manter sua integridade. O ser humano é a natureza transcendendo a si própria. A cognição, a racionalidade, são elementos não estanques da sensibilidade, são processos para a percepção. Dizer que o mundo não é natural e que a cultura é que comanda a realidade é uma contradição, pois que a cultura é natureza.
O ser humano não controla a natureza. Nunca controlou. O ser humano por ser apenas um duodécimo da natureza, não tem essa potência. A vontade humana de controlar o seu resto é apenas a inveja da potência que não possui. É um detalhe ainda não tido de que ao controlar a natureza, controla-se a si mesmo. A vontade humana ainda não encontrou o anseio da natureza, não encontrou a lógica de que é refém da natureza.
Desde os assim chamados estágios de barbaridade até os tão louvados estágios de civilização, o ser humano não fez mais do que sua missão: admirar e finalizar. Não digo destruir, pois que destruir demanda uma intencionalidade que não cabe ao ser humano – apenas uma marionete da natureza –, o projeto é finalizar. Dar fim à natureza, numa assertiva teleológica mesmo: contemplar-se plenamente em sua integridade, saindo da existência.
É sempre assim: estudar, analisar, metaforizar, florear, desvendar, construir, transformar, erigir, até que a natureza toda esteja contemplada e então, findada. Não existir. Pode ser que alguém identifique alguma deidade qualquer, mas o projeto da natureza deve ser bem esse mesmo.
Verdades .